sábado, 9 de agosto de 2008

O QUE É UM FILÓSOFO?

Este artigo que recebi de um amigo Filósofo, traduz de forma muito bem clara os equívocos que as pessoas – grande parte por falta de (in)formação, cometem ao se posicionarem (ou tentarem) perante o profissional formado em Filosofia, revelando o quanto nosso pais ainda precisa avançar epistemologicamente no que diz respeito à EDUCAÇÃO. Do contrário, ficaremos relegados a um atraso cultural que já perdura a mais de 500 anos em nossa Terra Brasílis.
O que é um filósofo? (Desidério Murcho)
Este fim-de-semana fui colocado perante um infelizmente bem conhecido dilema pela directora da revista "Os Meus Livros", de que sou colaborador: "O que ponho junto à tua fotografia? Ensaísta? Escritor?" Pois. Um licenciado em matemática é um matemático, ainda que nunca tenha descoberto um único teorema original; alguém escreve 100 páginas chorosas sobre dores de alma infantis e é um romancista ou um poeta; uma pessoa pespega meia dúzia de tintas numas telas ralas e é um pintor; mas alguém com formação em filosofia, autor de artigos e livros de filosofia... nunca é um filósofo. Penso que a confusão conceptual que provoca este estado de coisas é significativo e é disso que quero falar-lhe.
Se me apresentar como filósofo ao homem da rua, ele pensará que sou um diletante, um pretensioso francamente ridículo. Mas o mesmo homem da rua admite que eu possa ser um poeta, um romancista, um matemático ou um pintor. Estamos perante dois critérios bem distintos. No que respeita ao romancista, ao matemático, ao pintor, o homem da rua sabe distinguir os
muito importantes, com trabalho de valor original que se perpetua pelos séculos, da imensidão de outros, que todavia ainda merecem o títulozinho. Mas no que respeita aos filósofos, tal distinção não parece existir; para o homem da rua ou se é Platão, ou não se é filósofo, apesar de nem todos os matemáticos serem Fermat nem todos os pintores Picasso.
Penso que a razão de ser desta disparidade é o atraso cultural. O homem da rua está habituado à presença de matemáticos, pintores e poetas modestos; mas desconhece a existência de precisamente o mesmo tipo de pessoas modestas que fazem filosofia e portanto são filósofos, apesar de estarem longe de serem filósofos originais de perfil universal como Aristóteles. Este é mais um reflexo infeliz de um sistema educativo atrasado que impede o contacto das pessoas com a filosofia tal como ela é realmente feita por esse mundo fora. A filosofia surge como uma coisa estranha, distante, do passado, envolta em mistério e brumas — e portanto definir-me como filósofo só poderia ser um gesto de vão pretensiosismo. É esta mesma estrutura mental que não permite distinguir a filosofia da história da filosofia — pois a filosofia é algo de tão transcendente e estranho que só semi-deuses míticos e distantes a podem realmente fazer, restando-nos as soporíferas histórias da filosofia aos quadradinhos que nos vendem na escola.
O que há de grave neste estado de coisas, é que a filosofia tem um papel cada vez mais activo no desenvolvimento das ciências e na compreensão da vida pública. Não é possível compreender cabalmente a economia e as suas opções, nem as matemáticas ou as neurociências, sem uma formação mínima em filosofia — nem é possível compreender os fundamentos das religiões ou da arte, nem é possível encontrar respostas criativas e satisfatórias para os problemas da bioética, sem uma boa formação em filosofia. Assim, estranhar que possa haver filósofos que não se vestem de toga e não morreram há mais de um século num país distante, é um sinal seguro de que o caminho a percorrer para o desenvolvimento cultural do país é ainda longo.

7 comentários:

MARCENIA disse...
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MARCENIA disse...

É comum ouvirmos considerações errôneas acerca da aplicação prática da Filosofia bem como dos profissionais ligados a essa área. E é claro , para os amantes da SHOFIA ,só pode gerar um certo desconforto. Porém não concordo com tamanha injustiça em relação a Filosofia, embora tenha somente um perfil de abstração para alguns, ela não existe fora do mundo. Bem ao contrário, ela emerge e se aglutina nas entranhas dessa experiência: o cotidiano.

Unknown disse...

Não é fácil para pessoas comuns saberem exatamente o que um filosofo moderno faz. Eu não sei, não posso negar que tenho a impressão de que um curso superior de filosofia só tem aplicação para se dar aula de filosofia.

Moisés Dias de Brito disse...
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Moisés Dias de Brito disse...

Diferentemente do que dizem a maioria das pessoas um curso superior de Filosofia não serve apenas para dar aulas de filosofia: o que acho mais interessante de afirmar: "dar aulas de filosofia" é apenas um dos "mercados" que podemos perceber de imediato tendo em vista que o curso a que nos referimos é uma licenciatura. (E se fosse Bacharelado?). A parte mais comcreta da atuação profissional de um filósofo tem relação com aquilo que o modelo atual de desenvolvimento necessita para sobreviver: a estrutura mental de nosso pensamento. UAI! um maranhense diria: que coisa mais besta!
E primeiramente o que proporciona este nosso grandioso mundo moderno é a facilidade que temos de aprender. Aprender novas coisas. Novos comportamentos. Novos ofícios e profissões. Nós aprendemos e isso é lindo.
Mas se alguém quiser saber porque aprendemos: significa que deu um passo na direção da filosofia. Então, digo que nós, os filósofos simplesmente questionamos sobre aquilo que geralmente em nosso cotidiano não questionamos. E na luta para responder a estas perguntas desconcertantes que apenas os filósofos fazem e que nem todos podem fazer, criamos a cada dia um novo mundo. Pense um pouco e reflita. A questão traz em sí grande parte da resposta. Se não perguntássemos teríamos respostas? Eis o fundamento filosófico da realidade moderna. Ou não. É Uma questão.

Anônimo disse...
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Anônimo disse...

"Saber o que é um filósofo é algo difícil de determinar unicamente pelo fato de que não é possível ensiná-lo, é preciso 'sabê-lo' por experiência, ou ainda é preciso ser tão orgulhoso que não se queira sabê-lo. Mas o hábito que todos possuem de falar de coisas das quais não têm nenhuma experiência, há
como alvo principal o filósofo e as coisas filosóficas: um número muito limitado de pessoas tem condições de conhecê-lo e todas as opiniões populares acerca desse assunto são falsas."
Além do Bem e do Mal - 213.